sábado, 31 de maio de 2014

Incontinência urinária



 
O sucesso do tratamento da incontinência urinária depende do diagnóstico correto, objetivando-se a correção da disfunção ou alteração que causa a perda de urina. A história clínica e o exame físico completo são fundamentais na avaliação desses casos (84,85).

O diagnóstico da IUE é fundamentalmente clínico. Além da anamnese detalhada, que inclui um diário miccional (registro da hora, volume urinado e dos episódios de perda), procura-se também demonstrar objetivamente a perda urinária através do teste de Bonney. O teste de Bonney consiste na elevação do colo vesical pelo examinador introduzindo os dedos indicador e médio na vagina da paciente. O teste é considerado positivo quando a elevação do colo vesical durante o esforço impede a perda urinária percebida anteriormente. Nos casos cuja história não é típica e naqueles em que houve insucesso cirúrgico, podemos lançar mão de métodos auxiliares (124).

Pacientes com imperiosidade miccional, urge-incontinência, enurese noturna ou que foram submetidas a tratamento cirúrgico prévio devem ter sua avaliação complementada com estudo urodinâmico (88,89,90).

A importância do estudo urodinâmico nestas pacientes está em orientar o diagnóstico, auxiliar na escolha da forma de tratamento e fornecer informações complementares para o seguimento pós-cirúrgico (38,76).


TRATAMENTO CONSERVADOR COMPORTAMENTAL E FISIOTERÁPICO

A reabilitação fisioterápica tem importante potencial no tratamento, objetivando, fortalecer os músculos do assoalho pélvico, prevenindo o surgimento de futura incontinência, ou mesmo, de prolapso uterino; cistocele (queda da bexiga); uretrocele (queda de uretra); retrocele (queda de reto) e enterocele (descida da vagina fazendo-a cair, inchar ou ficar saliente). A fisioterapia também como objetivo, reeducar a bexiga; intervir no pré e pós-operatório intensificando os resultados cirúrgicos obtidos e melhorar a qualidade psicológica, inclusive sua auto-estima, e a qualidade de vida desses pacientes. A fisioterapia atua através de:

- TREINAMENTO VESICAL: Funciona em diversos casos de urge-incontinência e de incontinência reflexa, ou seja, aquela que ocorre subitamente “sem sensação prévia ou aviso”. Por exemplo, vamos considerar o caso de uma paciente cujo diário miccional mostrava períodos de continência de até duas horas, após o que ocorria urgência miccional de forte intensidade. A paciente foi orientada a urinar a cada duas horas, independentemente do desejo miccional. Após uma semana sem perder urina, a paciente foi orientada a aumentar progressivamente o intervalo entre as micções em meia hora.


 EXERCÍCIOS DA MUSCULATURA PÉLVICA: A cinesioterapia utiliza exercícios para fortalecimento dos músculos perineais e abdominais, baseada no preceito de que os movimentos voluntários repetidos do músculo estriado proporcionam aumento da força muscular, melhorando o tônus do esfíncter periuretral(100) Os exercícios perineais, também conhecidos como Exercícios de Kegel, são úteis tanto para o tratamento da Incontinência Urinária quanto para a urge-incontinência. Trabalhando inicialmente com pacientes idosas, o Dr. Kegel observou que os exercícios melhoravam não só a continência mas também o prazer sexual. Tratando-se de uma opção simples e barata, os exercícios são muito atraentes, porém é preciso salientar a necessidade de motivação para a obtenção de bons resultados, uma vez que os exercícios devem ser realizados constantemente e por toda a vida (92). Assim, o tratamento exige do médico disposição para orientação e apoio constante para conseguir resultados satisfatórios (91,93).

- PESSÁRIOS VAGINAIS: Os mais modernos são feitos de silicone na forma de uma pulseira com duas elevações. Como na maioria dos casos de incontinência urinária a bexiga se encontra prolapsada, a introdução do pessário na vagina eleva a bexiga e a uretra para a posição normal, simulando o efeito de uma cirurgia corretiva. Admite-se que após a adaptação a esse tratamento, 80% das pacientes permaneçam secas ou com melhora da incontinência (31,32).

- USO DE CONES VAGINAIS: O fortalecimento dos músculos do soalho pélvico através da reeducação perineal tem-se revelado apropriada numa série de mulheres com incontinência urinária, constituindo a base da terapêutica conservadora. O uso de cones vaginais permite taxas de sucesso objetivas comparáveis aos exercícios de Kegel standart (17).

O renovado interesse pelos exercícios da musculatura pélvica para o tratamento da incontinência urinária segue a tradição iniciada por Kegel, em que através do exercício voluntário se pretende aumentar o tônus dos músculos do pavimento pélvico, e estriado uretral, e conseqüentemente o aumento da pressão uretral, de modo a resultar superior à pressão vesical, o que em termos urodinâmicos corresponde à continência urinária (15).

Plevnik (1985) introduziu este tipo de exercícios utilizando cones vaginais demonstrando que a mulher ao tentar reter os cones de pesos crescentes na vagina aumentava o tônus da musculatura pélvica. Esta técnica consiste na utilização de um conjunto de cones de tamanhos iguais, mas de peso crescente, com forma anatômica que permite a sua introdução na vagina. A ação reflexa automática da musculatura do pavimento pélvico proporciona uma fisioterapia interna que rapidamente restabelece o tônus muscular interessado. A recuperação será notada ao fim de duas a três semanas, momento este em que se recomenda a utilização de pesos superiores, a fim de poder continuar a melhoria do processo (13).

- BIOFEEDBACK: Este método pode ser utilizado para tratar tanto a incontinência de esforço quanto a urgência miccional (41). A maioria dos equipamentos existentes possui um sensor eletrônico que é introduzido na vagina para registrar a atividade dos músculos pélvicos, e eletrodos colados na parede abdominal para monitorar sua atividade e informar se a musculatura está relaxada (19,110).

Assim, quando a paciente contrair corretamente a musculatura perineal haverá uma representação auditiva ou visual (por exemplo, acender de luzes) informando se os músculos corretos estão se contraindo e também a intensidade das contrações (22,25). Os resultados aparecem depois de cinco semanas, com exercícios realizados uma ou duas vezes por semana (39). Em alguns países existem modelos mais simples e portáteis que podem completar o tratamento em nível domiciliar (16,18).

- OBTURADORES URETRAIS: Têm por objetivo ocluir mecanicamente a uretra. Existem vários modelos no mercado e outros estão em fase de testes. Esse tipo de paliação está indicado para os casos de incontinência urinária mais grave, como nas pacientes que utilizam fraldas ou forros e que não desejam ou não podem ser submetidas ao tratamento cirúrgico. O dispositivo é descartável e não deve ser reutilizado, implicando a troca por um novo obturador a cada micção (20,21).

- ADESIVOS URETRAIS: De maneira semelhante aos obturadores, os adesivos uretrais ocluem a uretra ao nível do meato. A oclusão pode ser obtida tanto por adesivos especiais que aderem à mucosa periuretral (figura 5) quanto por dispositivos plásticos que com o auxílio de um gel apropriado criam vácuo e selam a uretra distalmente (67,68).

- ELETROESTIMULAÇÃO: A terapêutica conservadora é realizada através de técnicas que visam o fortalecimento da musculatura do assoalho pélvico, pois a disfunção muscular representa importante fator etiopatogênico da incontinência urinária de esforço (28). O nervo pudendo é um nervo eferente tanto par ao assoalho pélvico como para o esfíncter estriado peri-uretral. Sua lesão pode ocasionar insuficiência dos elementos de sustentação, bem como o relaxamento da musculatura peri-uretral, comprometendo a integridade do assoalho pélvico e determinando, assim, o desencadeamento da incontinência urinária (104,105). Considerando a etiologia neuromuscular da incontinência urinária de esforço, vários tratamentos foram propostos com o intuito de restabelecer a função muscular e nervosa, sendo a eletroestimulação uma dessas alternativas terapêuticas (27,46).

Descrita primeiramente por Caldwell em 1963, a eletroestimulação do assoalho pélvico para tratamento da incontinência urinária de esforço apresenta resultados conflitantes. Os índices de cura variam de 30% a 50%, ocorrendo melhora dos sintomas em 6% a 90% das pacientes. A utilização de distintos critérios na avaliação diagnóstica da incontinência urinária de esforço, nos parâmetros definidos para a eletroestimulação e nos métodos empregados para a análise dos resultados são responsáveis pela diversidade dos resultados obtidos na literatura (29,30).

Estudos que avaliam os efeitos da eletroestimulação do assoalho pélvico no tratamento da incontinência urinária de esforço caracterizam-se, muitas vezes, por análises subjetivas e que desconsideram as distintas etiologias da perda urinária. Mesmo com o avanço nos métodos propedêuticos e o surgimento de estudos clínicos controlados, permanece acentuada discrepância com relação à padronização do tempo de tratamento, dos parâmetros definidos para a eletroestimulação e dos métodos utilizados na análise dos resultados (33).

Ao contrário das modalidades descritas, a eletroestimulação é um exercício passivo, ou seja, uma forma de exercitar a musculatura perineal sem “fazer força” (5). O tratamento é realizado introduzindo-se na vagina um eletrodo que se assemelha a um absorvente interno. O eletrodo é ligado a uma fonte geradora de impulsos elétricos que promovem a contração da musculatura perineal, eles aumentam a força de contração do músculo elevador do ânus, o comprimento funcional da uretra e melhora a transmissão da pressão abdominal. É importante salientar que o tratamento não apresenta efeitos indesejáveis e que nos casos de falha não haverá prejuízo para uma eventual cirurgia. Encontra-se em fase final de estudos a estimulação extracorpórea por ressonância magnética, método não-invasivo no qual a paciente senta-se numa cadeira que possui um dispositivo que realiza os exercícios perineais sem que haja nenhum contato direto (53,54).

Os parâmetros da eletroestimulação ainda não estão completamente padronizados mas recomenda-se a utilização do máximo estímulo intermitente tolerado sem dor (mínimo de 15 mA), com razão temporal estímulo/descanso mínima de 1:2, uso de probes via vaginal/anal, em sessões de 15 a 30 minutos, de 1 a 3 vezes por semana. As freqüências de 50 a 100 Hz são sugeridas para a Incontinência de esforço e de 10 a 20 Hz, para os casos de instabilidade do detrusor e Urge-incontinência, e ainda de 20 a 50 Hz, para Incontinência Mista, segundo alguns autores (55,56).

Os efeitos colaterais descritos com a utilização da eletroestimulação transvaginal do assoalho pélvico são raros, destacando-se: dor, irritação vaginal e infecção urinária. A utilização da eletroestimulação por curtos períodos diminui o surgimento de tais efeitos para níveis inferiores a 14%.

As contra-indicações são: gravidez, infecções vaginais, diminuição da percepção sensorial da vagina, infecção urinária, arritmia cardíaca e menstruação (82,83).

Poucos estudos avaliam os efeitos terapêuticos, a longo prazo, da eletroestimulação no tratamento da incontinência urinária. Eriksen e Eik-Nes (1989) relataram cura ou melhora em 68% das mulheres eletroestimuladas, mantendo-se a taxa de sucesso de 56% dois anos após a terapia. Appel (1998) realizou estudo com seguimento de seis anos, demonstrando que apenas 40% das mulheres apresentaram melhora permanente após a eletroestimulação. Ressaltou, entretanto, que a associação de exercícios regulares do assoalho pélvico para fortalecer a musculatura perineal poderá interferir, positivamente, na manutenção dos resultados (62,63).


CONCLUSÃO

A incontinência é, evidentemente, mais comum em mulheres e o risco aumenta com a idade. Cabe às mesmas, procurarem um tratamento mais específico com a fisioterapia.

A reeducação períneo-esfincteriana ressurge como uma opção em casos selecionados de incontinência urinária de esforço exigindo disponibilidade e motivação por parte de médicos, e, sobretudo das pacientes.

A eletroestimulação pode ser considerada, quer como abordagem terapêutica inicial, como alternativa ao procedimento cirúrgico, ou ainda como adjuvante a outros métodos de tratamento, respeitadas suas indicações e limitações. Minimamente invasiva, com efeitos colaterais desprezíveis e aceita pela maioria das mulheres, tem se tornado uma terapia atraente, particularmente quando associada à motivação e disciplina, requisitos indispensáveis para que se atinjam e se mantenham os melhores resultados.

A incontinência urinária é erroneamente vista como um processo natural do envelhecimento. As melhorias dos indicadores de saúde, como o aumento da expectativa de vida, assim como o avanço da medicina fazem com que observemos o fenômeno do envelhecimento da população. Cada vez mais devemos estar atentos e aptos a tratar as doenças do idoso, melhorando dessa forma sua qualidade de vida.

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